Quebrar barreiras ao adentrar ambientes tradicionalmente masculinos nem sempre é tarefa fácil, ainda mais quando se fala em mulheres ocupando cargos de liderança e alto escalão. Mas para que outras possam vir, alguma delas precisa ser a pioneira e abrir portas às demais.
Quem bem entende disso é Daniela Silveira Maidel, a delegada-geral da Polícia Judiciária Civil (PJC) de Mato Grosso e primeira mulher a comandar a instituição. Com 23 anos de serviços prestados na corporação, a servidora se orgulha e sente muito apoio e respeito na posição que ocupa.
Ela, que se candidatou após 20 anos atuando como delegada de polícia, participou da formação da lista tríplice e foi a mais votada pelos colegas. “Minha maior alegria foi ser reconhecida por eles. A gente fala muito a razão de ser mulher, mas nós temos talento, temos competência e eu me senti reconhecida, acho que foi o ápice da eleição, deste momento da PJC”, recorda.
Natural de Santa Catarina e formada em Direito pela Universidade de Itajaí, a delegada ingressou na Polícia Civil em 2001, vinda de uma turma de 20 delegados, dos quais apenas 3 eram mulheres. Mesmo nas turmas de investigadores e escrivães, eles também predominavam.
Embora não exista nenhum instrumento propriamente dito que limite ou barre o número de mulheres, cuja as vagas são de ampla concorrência, ainda há mais candidatos homens que mulheres, algo que é refletido na própria quantidade dos servidores. Atualmente a Polícia Civil de Mato Grosso conta com o efetivo de 232 delegados e somente 46 delegadas.
Ao olhar para o passado, ela relembra os desafios que enfrentou ao longo da carreira. “Nós [mulheres] éramos em número menor, era uma época também de mudança de mentalidade social. A gente fala muito da polícia civil, mas a polícia espelha o que acontece na sociedade. Nós, os policiais, fazemos parte da sociedade, o que também reflete o momento social e histórico que vivemos”, afirma.
Emocionada, Daniela revela que nunca teve a pretensão pelo cargo e não o tinha como sonho até então, quando veio ao Estado fazer concurso em 1999, influenciada pelo marido.
“O tempo foi passando e fui me apaixonando pela profissão. Todos nós policiais civis, temos uma missão muito grande na sociedade. Não falo só como delegada, mas todos nós temos essa missão. Sou grata a Deus pela minha profissão, pelo que eu vivo e pela oportunidade que tive de vir para Mato Grosso e para a Polícia Civil de Mato Grosso”, afirma em meio a sorrisos e lágrimas.
Luiz Leite
Ela se recorda que, quando trabalhava no interior, a população não estava acostumada a ver uma delegada. Jovem, passou no concurso com apenas 24 anos de idade. Mesmo com a inexperiência logo no início da carreira, relata que nunca se deixou abalar por isso.
“Quando a gente está numa posição desta, na Polícia Civil, em qualquer outra instituição, em qualquer outro órgão, a gente tem que estar firme no propósito que nós temos. Eu soube receber, entender isso e também superar”, destaca.
Com uma vida dedicada à instituição, Daniela foi titular da Delegacia de Polícia de São José do Rio Claro por 5 anos e em 2007 foi titular da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso, de Várzea Grande, onde permaneceu por 8 anos. Foi diretora-geral adjunta em 2016 e delegada regional de Várzea Grande em 2017.
Daniela fala que não sente que sua gestão é questionada e fica feliz em dizer que existe um momento de muita maturidade na Polícia Civil. “Às vezes se esperava algum questionamento, por ser mulher, mas não. Eu tenho um apoio muito grande e um reconhecimento da competência. Não estou falando para me gabar, mas assim. É o trabalho. Quando você entra numa instituição, você trabalha, você se dedica e se reconhece”, ressalta.
Luiz Leite
Ela relembra outras delegadas, investigadoras, escrivãs que vieram anteriormente e não foram reconhecidas e que inclusive tiveram de lidar com ambientes e situações em outra época ainda mais complexa. “Elas sofreram preconceito, humilhação, e mesmo assim fizeram suas carreiras. Como nós, elas criaram seus filhos trabalhando, passando por todas as dificuldades”, pontua.
Por isso, a motivação de ser reconhecida e de ter ao lado também uma equipe feminina a faz continuar, mas também é motivo de atenção e preocupação devido à responsabilidade que tem e pela missão de promover e incentivar a presença de mulheres na formação de lideranças.
“Nós precisamos disso para nos mantermos uma instituição moderna, uma instituição que sabe entender a sociedade da qual ela participa”, diz.
Apesar da rotina extenuante e das grandes responsabilidades, a delegada afirma que vale a pena estar à frente da instituição, o que para ela é uma honra e algo que faz com comprometimento e dedicação, já que é mãe, inclusive de uma menina, a quem ensina com o exemplo de mulher e profissional.
Questionada sobre o que é ser mulher, ela enfatiza: “Para mim, ser mulher é ser forte, determinada, responsável, e no meio disso tudo, ter docilidade, tranquilidade, afetividade. É fazer essa mistura de todos esses ingredientes, mas de uma maneira afetuosa, leve. Eu acredito que é isso e mais tudo que você puder colocar. Somos fortes, determinadas, sensíveis e é uma alegria ser mulher” conclui.